domingo, 25 de abril de 2010

Áreas cerebrais disputam decisão de gastar ou poupar



Sistema pode explicar fé religiosa do esforço em vida para recompensa pós-morte

Experimento mapeou os cérebros de voluntários em um teste no qual deveriam escolher entre consumir ou economizar seus recursos


Um estudo de mapeamento cerebral pode ajudar a entender a diferença entre o cérebro de uma pessoa esbanjadora, que gasta dinheiro como se cada dia fosse o último, e o de um pão-duro crônico, que apenas poupa, sem aproveitar o que juntou. Os mecanismos que interagem quando uma pessoa decide entre consumir ou armazenar o recurso, dizem os cientistas, são os mesmos que embasam a fé religiosa de alguém que se esforça em vida para ter o paraíso após a morte.
O que os neurocientistas da Universidade de Hamburgo, na Alemanha, fizeram foi observar a atividade cerebral de voluntários enquanto tomavam decisões financeiras. Elas envolviam escolher entre receber menos dinheiro imediatamente ou uma quantia maior dentro de alguns meses. Enquanto isso, eram estimulados a pensar em eventos do futuro, como longas viagens de férias ou cursos caros que desejariam fazer.
Os pesquisadores puderam, assim, mapear as áreas do cérebro que trabalham para decidir entre receber uma recompensa agora ou esperar por algo melhor amanhã. Duas são importantes. Grosso modo, uma é mais imediatista, e a outra faz o papel de chata, trazendo a lembrança de que não se pode pensar apenas no presente.
O córtex cingulado anterior é quem responde à recompensa, uma área muito ligada à tomada de decisões. Se ela faz peso para que escolhas impulsivas sejam feitas, o hipocampo, outra parte do cérebro, entra na briga contra isso. Ele é o responsável por criar imagens do futuro na mente humana -é a parte do cérebro que faz com que as pessoas contratem planos de previdência, digamos.
O hipocampo envia, então, esses sinais relacionados à recompensa futura para o córtex cingulado anterior, influenciando a tomada de decisão.
"Imaginar com força o futuro acaba reduzindo a quantidade de escolhas impulsivas que fazemos", diz Jan Peters, um dos neurocientistas que assinam o trabalho na revista "Neuron".
Os pesquisadores ainda estão apenas descobrindo quais partes cerebrais atuam avaliando o custo-benefício de esperar o tempo passar e não sabem bem como diferenças individuais entre cérebros podem justificar perfis mais esbanjadores ou econômicos. Mas é possível que um hipocampo mais ativo, por exemplo, faça com que certas pessoas criem mais imagens ligadas ao futuro nas suas mentes, dizem os cientistas.
Apesar de o estudo envolver escolhas relacionadas a dinheiro, acredita-se que os mesmos circuitos do cérebro estejam envolvidos em outras decisões. Um dos exemplos pode envolver a religião. Quando um fiel se flagela expiando seus pecados para escapar do inferno, está tomando uma decisão pensando em vantagens futuras.
A ideia de "renúncia agora, paraíso depois" faz parte das cinco maiores religiões do mundo, lembra o economista Eduardo Giannetti, autor de "O Valor do Amanhã". "Foi esse raciocínio que levou à condenação, no séc. 4º, do suicídio como "atalho" para o paraíso, prática corrente nos primeiros séculos do cristianismo", diz.
Humanos têm maior habilidade em trocar o presente pelo futuro do que os animais, que se assemelham mais a crianças pequenas. Elas vivem o momento, sem pensar em guardar papinha para depois. Animais, porém, também sabem adiar recompensas. Roedores, por exemplo, sabem enterrar comida e são poupadores natos.

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